Exposições
Exposição – Estofo
Na arte as questões de gênero não são, a principio, relevantes. O fato de um trabalho ser elaborado por um artista masculino ou feminino tem uma importância menor, desde que essa condição não seja ela mesma o objeto do trabalho.
Claro que as visões de mundo são distintas para homens e mulheres, talvez não mais do que para qualquer pessoa em relação à outra, mas o senso comum para trabalhos feitos por artistas mulheres, portanto trabalhos ditos “femininos”, envolveriam delicadeza, celebração da vida e, quando muito, uma sexualidade branda.
Há uma visão feminina nos trabalhos de Mariana Chaves; diversa, porém, tanto do que se espera como quanto às linguagens que ela utiliza.
Mas o que seria essa visão feminina?
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A exposição ESTOFO ocupa os espaços expositivos da Casa Contemporânea com uma economia de meios.
Assim que entramos temos à esquerda uma instalação onde uma poltrona com uma padronagem que se esvai para o chão parece olhar para a parede; lá, uma mariposa. Na sala oposta, numa quase penumbra, há três vídeos e um desenho. O desenho, quase negro, nos diz, em outra linguagem, algo que o vídeo “o vagalume e a mariposa” e o pungente “Falena” contam: uma procura, um cansaço, a impossibilidade de desistir.
O vídeo “estofo” mostra o processo de derretimento da pequena cadeira que se encontra num nicho no hall. Aqui a conversa se faz com a poltrona que está na primeira sala; uma passagem do tempo que descarna o que vimos assim como nos também descarnamos, nos esvaímos com o tempo.
Subindo as escadas um “vagalume” solitário procura algo, mas não pode ver esse objeto que procura. Ele faz a ligação para o andar superior onde temos o vídeo “náusea”. O insólito assume a forma de uma cadeira que bóia no mar e nos prepara para entrarmos na sala onde dialoga com uma série de desenhos onde uma cadeira, também de forma estranha, submerge. Em paredes opostas temos as telas “cadeira” e “poltrona” quase como naturezas mortas perdidas em meio a um branco.
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Mariana tem uma relação particular com o corpo, com o seu corpo, como parece ser natural a quem executa performances. Uma busca por limites a serem testados/quebrados, mas nestes trabalhos ela consegue lidar engenhosamente com uma transferência do corpo. Através de objetos banais ela se questiona e nos questiona sobre vida, transferida para uma poltrona, e a morte, através da imagem da cadeira. Estas analogias sobre a vida e sua fugacidade, esse esvair com o tempo que transforma tanto o estofo de uma poltrona quanto nosso corpo e a morte ou transcendência através da estrutura (esqueleto?) de uma cadeira.
Da mesma forma, a mariposa, com sua necessidade de escuridão mas atraída por um foco de luz, evoca não só uma sexualidade latente mas algo que parece nos afrontar como a dizer sobre brasas adormecidas que esperam apenas uma brisa para queimar o que está próximo. Mesmo quando nosso estofo se torna velho, gasto, cansado, ainda assim somos capazes de dar/querer conforto; mas convém lembrar de Lilith: a intensidade da entrega requer a mesma medida do outro e não aceita ser submetida. Não fugimos do que somos.
Marcelo Salles